Há dez anos, fizemos a seguinte pergunta durante o Ethanol Summit, um dos mais importantes evento do setor sucroenergético; - “Estamos ouvindo muitas pessoas falarem sobre o etanol de segunda geração (Etanol 2G ou E2G), mas ninguém comenta a utilização do etanol como matéria-prima para utilizar em células a combustível (Fuel Cell ou FC em inglês) visando a geração de energia elétrica, existe desconhecimento desta tecnologia?”
A resposta obtida não atendeu nossas expectativas e foi a de que, com a produção do E2G, poderíamos duplicar a produção do combustível com a mesma matéria-prima cana-de-açúcar. As FCs ficaram sem resposta e nos parece que ainda existem muitas pessoas que desconheçam este equipamento.
As FCs foram desenvolvidas na década de 50 e atualmente vem sendo estudadas, objetivando sua utilização como geradores de eletricidade, principalmente na Europa.
O que notamos é que nestes dez anos foi realizado, pelos órgãos de fomentos nacionais, um investimento bastante significativo nas pesquisas para a produção de Etanol 2G, sem muito sucesso em sua viabilidade econômica, o que já era de se esperar; pois a produção do Etanol de primeira Geração (que ainda temos muito à aprender) é uma ocorrência natural, já o 2G necessita de uma série de operações para sua obtenção, e muitas delas caras e outras ainda a serem solucionadas e viabilizadas.
Considerando a cana-de-açúcar para produzir o Etanol, podemos obter o 1G, através da fermentação dos açúcares contidos no caldo e o 2G através de reações bioquímicas utilizando-se por exemplo complexos enzimáticos para quebra das cadeias de celulose, hemi-celulose e principalmente as de lignina, objetivando a obtenção de pentoses e hexoses e somente a partir deste ponto é que, similarmente ao processo fermentativo do 1G, se obtém o etanol.
As “Fuel Cells (FC) foram equipamentos desenvolvidos na década de 50 para gerarem eletricidade e são abastecidas com hidrogênio. Basicamente é composta de dois módulos, um reformador, utilizado para separar o hidrogênio das moléculas de diferentes matérias primas e um módulo gerador de energia elétrica que utiliza o hidrogênio para tal finalidade.
Existem atualmente diversas tecnologias de FCs, para diferentes tipos de matéria-prima, assunto que não cabe explorar neste artigo, mas o mais importante é saber que em nossas mãos temos uma matéria prima em abundância e de grande importância para alimentar estes equipamentos. O ETANOL.
As FCs mais conhecidas são as que utilizam a água como fornecedora de hidrogênio, pois cada molécula possui dois átomos de hidrogênio e um de oxigênio. Já o etanol, é considerado como a molécula renovável, sustentável, não fóssil e economicamente viável para o fornecimento de hidrogênio para gerar eletricidade para estes equipamentos, pois possui seis átomos de hidrogênio em sua molécula.
As tecnologias de mobilidade elétrica são muitas, incluindo os veículos com baterias recarregáveis, os híbridos que possuem motor à combustão e também baterias os com células à combustíveis, alguns com reformadores embarcados e outros somente com tanques de hidrogênio.
O desenvolvimento das FCs está sendo motivo de vários segmentos dos setores de mobilidades, incluindo aí, desde veículos leves até locomotivas, passando por tratores e caminhões.
Já existem programas de utilização destas células em locomotivas na Europa a partir de 2022 e também nos EUA, já a partir do próximo ano de 2020 uma das maiores companhias ferroviárias passará a utilizar estes equipamentos. Em ambos os casos, não se tem notícias de qual matéria prima será utilizada.
Que a mobilidade mundial será baseada na eletricidade, isto já não se tem mais dúvidas.
A partir do próximo ano, as montadoras da península escandinava, deixarão de produzir veículos leves movidos com combustíveis líquidos e até 2030, estes mesmos países não queimarão uma só gota de combustível fóssil.
A partir destas observações, necessitamos voltar nossos pensamentos e ideias para o aperfeiçoamento e desenvolvimento de tecnologias para se tirar mais eletricidade de nosso setor sucroenergético, principalmente no que se diz respeito às Células à Combustível.
Uma delas é a utilização do próprio etanol, que basicamente ao nosso ver, será a melhor opção para ser ofertado como matéria prima para abastecimento dos veículos elétricos movidos à FCs. Neste caso toda nossa rede de distribuição já está pronta. Cabe salientar que este etanol, difere do anidro que aditiva a gasolina e também do hidratado que abastece os veículos flex, mas é o mesmo obtido nas unidades industriais, porém com maior teor de água, o que certamente irá baratear sua produção, uma vez que as destilarias necessitarão apenas da coluna A para a obtenção deste produto.
Outra, opção na obtenção do hidrogênio e que algumas unidades já estão adotando, é a produção de metano a partir da biodigestão da vinhaça, neste caso se tem moléculas de metano que possuem quatro átomos de hidrogênio. Porém não se tem notícia de que existe a utilização do metano em FC, apenas é utilizado para queima
Finalmente e, mais complicado e trabalhoso seria a gaseificação de palhas, pontas e bagaço para geração de gás de síntese. Muito ainda se deve investir para viabilizar esta tecnologia.
Nossa visão das unidades agroindustriais sucroenergéticas para 2050 será a produção alimento como açúcar, (alimento mais barato do mundo se considerar a unidade monetária por quilocaloria obtida); carne (em sistema de confinamento utilizando levedura seca como fonte proteica e bagaço pré-hidrolisado como volumoso); grãos (leguminosas) em áreas de renovação do canavial; bioeletricidade a partir das células à combustível utilizando o hidrogênio do etanol e do metano da biodigestão da vinhaça e a produção de bioprodutos de alto valor agregado, como vitaminas, proteínas, ácidos orgânicos, enzimas, aminoácidos, polímeros e toda uma gama de produtos possíveis de se obter a partir da cana-de-açúcar.
Quem viver verá, eu certamente estarei presenciando estas transformações com a autorização do Grande Arquiteto, assim espero.
Até lá!